16 de abril de 2025

Biopirateando a praga

Por José Carlos Sá

A formiga-colheitadeira-gigante-africana é a preferida pelos voyeurs do trabalho alheio (Foto Ants-kalytta.com/Reprodução)

Há muito tempo não ouço ninguém falar que levou uma surra de formigas lava-pés, daquelas que picam você e cada picada parece que é uma queimadura feita com a brasa de um cigarro. Depois da dor vem a coceira e no lugar da picada fica o inchaço e aparecem bolhas. 

Dizem os cientistas que quando as formigas lava-pés picam as pessoas, injetam através dos ferrões  um veneno de alcalóides que produz a sensação de queimadura, daí o outro nome da praga: formigas-de-fogo.

A Solenopsis invicta – até no nome ela mostra que é danada – é nativa da América do Sul, mas já está se espalhando pelo mundo e se tornou um flagelo em pelo menos 11 estados norte-americanos, onde chegou na década de 1930 junto com alguma mercadoria brasileira com destino ao Texas. Por não ter predador natural, o bichinho se espalhou e foi comendo o que achava pela frente ou por baixo.

Em uma matéria de 2016, a Revista Superinteressante enumera por que os norte-americanos não gostam da formiga vermelha (não é pela cor que lembra os comunistas, garanto): “[Atacam] plantações, outros insetos, pequenos animais, madeira, pneus e até fios elétricos enterrados. Ataca a agricultura, estradas, edifícios e áreas de recreação. Sua mordida fere trabalhadores manuais e pode ser mortal para alérgicos”. 

Contrabando de formigas exibicionistas

As formigas quenianas estavam acondicionadas em tubos de ensaio, prontas para emigrar para a Europa ou Ásia (Foto Reuters/CNN/Reprodução)

A razão desse introdutório foi que li sobre as prisões de quatro pessoas flagradas com “cinco mil formigas (gigantes) selvagens”, da espécie Messor cephalotes (ou formiga-colheitadeira-gigante-africana), que seriam contrabandeadas do Quênia e levadas para a Ásia e para a Europa. 

O valor dos insetos apreendidos é de aproximadamente R$45 mil no mercado clandestino de animais exóticos. As formigas-rainha são as mais valiosas e podem ser vendidas por R$780, a unidade (Enquanto pesquisava para esta crônica, encontrei vários anúncios de venda de formigas gigantes, com entrega em domicílio).

Os contrabandistas, dois belgas, um vietnamita e um queniano, foram acusados de posse ilegal e tráfico de animais selvagens vivos. Antes as autoridades do Quênia combatiam o contrabando de partes de animais maiores, como elefantes, rinocerontes e pangolins. Agora correm atrás de formigas e depois, o que será? Bactérias?

Se eu fosse me basear apenas por uma notícia, ia imaginar que as formigas-rainhas da espécie Messor cephalotes eram mais valiosas por terem ”sangue azul”. Mas não é isso. 

Da mesma forma que tem (muitas) pessoas que pagam à Rede Globo para ficar ‘brechando’ os BBBs da vida, há quem compre essas formigas graúdas – “de 20 a 24 mm de comprimento e bela coloração vermelha e marrom/preta” para colocá-las em caixas transparentes e passar o dia olhando o bichinho trabalhar e construir as complexas colônias onde reinam.  

Nessas horas sempre lembro de uma tia – já falecida – que quando eu contava a ela algum fato bizarro ou esdrúxulo, dizia: – Neném, é o fim do mundo que está chegando!” Eu acho que é mesmo, Maria.

[Crônica LXI/2025]