24 de junho de 2024

Ainda é tempo de ler Rachel – A resenha de hoje

Por José Carlos Sá

Capa da edição de O quinze, que comprei no brechó, com o selo do MEC (Foto JCarlos)

É o segundo autor com quem eu estava em débito que leio em uma semana. Desta vez, saldei minha dívida com a escritora e jornalista Rachel de Queiroz, que conheci na última página da revista O Cruzeiro, há muitos anos. Naquele tempo, eu recém-alfabetizado, entendia que o sobrenome dela era pronunciado “Quêiroz”, com um ‘chapeuzinho’ imaginário sobre o “e”. Não sei de onde tirei isso.

Deixando os entretantos e indo aos finalmente. Encontrei o livro “O quinze” (Editora Cameron, Rio de Janeiro, 2018), garimpando em um brechó. É uma edição que foi distribuída gratuitamente pelo Ministério da Educação e traz um carimbo com os dizeres “Biblioteca – EEB Wanderley Junior – Patrimônio (em branco) – Doação (em branco)*”.

O assunto é o que ficou conhecido na literatura como “a grande seca”, que afligiu o nordeste brasileiro em 1915, provocando a morte de um número entre 400 e 500 mil pessoas, sem falar nas perdas na pecuária e na agricultura. Além da fome, também a varíola ajudou a dizimar as populações. Nessa época houve o incentivo para a migração para a Amazônia e para outras partes do Brasil, nesse caso sem nenhum estímulo.

Campo de concentração na estação de Iguatu (CE), durante a seca de 1915 (Foto Kênia Souza Rios/Reprodução)

Para quem ficava no Nordeste, o governo adotou os “campos de concentração”, onde os flagelados pela estiagem recebiam alimentos – farinha e carne seca – e  eram aproveitados em frentes de trabalho, como a construção de açudes e de estradas. 

No livro, Rachel de Queiroz usa a seca como pano de fundo das histórias de Conceição e Vicente, um casal de primos, que gostavam um do outro, mas que por suas características pessoais nunca se declaram. 

Também há a triste história da família do ex-vaqueiro Chico Bento, que perdeu o emprego, por não ter mais gado para cuidar e vai a pé do interior do Ceará para Fortaleza em busca de auxílio para a família. No percurso, morreu um filho – que se envenenou comendo “mandioca brava” – e um outro se extraviou. Na capital, após trabalhar em algumas frentes, Chico Bento e família seguiram para São Paulo.

Gostei da leitura do livro, que foi a estreia da escritora. Ela é objetiva e não floreia nada; nem a reação das pessoas perante as condições climáticas, nem as situações pessoais. Um livro árido, como a situação narrada, porém na dose certa.   

Recomendo.

* EEB Wanderley Junior – Pesquisei onde é esta escola e vi que fica próximo, geograficamente, ao brechó onde comprei o livro. Seria uma caso de migração ilegal para a polícia investigar?