05 de fevereiro de 2024

Os acordes do despertar

Por José Carlos Sá

A I.A. do Bing.Com criou a imagem base e eu fiz o resto…. (Bing.com/JCarlos

No amanhecer no meu bairro não tem galos cantando.

No amanhecer do meu bairro não tem passarinhos cantando, nem mesmo um solitário curió engaiolado.

No amanhecer do meu bairro não tem grama orvalhada, aliás, não tem nem grama.

No amanhecer do meu bairro tem cachorro latindo, criança chorando, enquanto grilos esparsos emitem o irritante cricri; algum sapo insone coacha.

Ruídos de descargas são ouvidos em profusão, junto com vozes de mães acordando os filhos para irem à escola, que formam, junto com tosses renitentes, uma estranha sinfonia.

No entanto, o som mais marcante e permanente nada tem de poético. Ele é formado por centenas de padeiros tocando insistentes buzinas dos carrinhos que empurram ou das bicicletas que montam.

Eu não sabia que existia tanto padeiro.

Às vezes desconfio que é a mesma pessoa que circula em volta da minha casa, torturando-me para que eu compre pão.

Durante o dia, mais espaçadamente, as buzinas são ouvidas à distância ou próximo. É como se avisasse: Não se esqueça de mim. De madrugada estarei contigo. 

 

[Crônica III/2024 – Texto publicado originalmente no jornal O Guaporé, de Porto Velho (RO), em 1990]

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