Há alguns meses li um artigo na Folha (infelizmente não guardei) em que a autora dizia que cada pessoa tem um diferencial – igual às impressões digitais – que a distingue das outras: Um sabe contar uma piada, outra gosta de se dizer doente de qualquer mal que exista, aquele vê todos como uma ameaça a seu trabalho, a seu cônjuge ou sei lá o quê. Ela afirmava que devemos tentar identificar estes dons, que chamou de “graças”, no outro.
A autora foi mais além e escreveu que, quando antigamente se perguntava “qual a sua graça?” se queria saber qual a especialidade do interpelado,. Acabou que o “qual a sua graça?” ficou como uma pergunta sobre o nome de alguém. Então o questionamento virou uma variante, mais elegante talvez, de “qual o seu nome?” ou “como você se chama?” E este modo de falar ainda é usado por pessoas mais velhas até os dias de hoje.
O cara perguntava “qual é a sua graça?” e pai contava mais piadas (Ilustra Pintrest)
E tome piada
Meu pai frequentou por muito tempo uma barbearia em Teófilo Otoni (MG). Ele cortava os cabelos quinzenalmente, mas ia ao local todo sábado pela manhã. Era na barbearia que falavam de política, de futebol e, claro, da vida dos outros. Especialmente dos ausentes. Entre os frequentadores habituais havia gozações com o barbeiro e entre eles mesmos por qualquer motivo.
Em um sábado apareceram dois viajantes, que aproveitaram para cortar os cabelos. Um deles ficou prestando atenção às piadas que o meu pai contava. Antes de sair se dirigiu a ele, se apresentou e perguntou: – Qualé sua graça? Pai pensou que fosse um elogio ao repertório de piadas e contou mais algumas em sequência.
O cara morreu de rir e perguntou novamente a graça do meu pai. Este já ia enfileirar mais umas anedotas, quando o barbeiro gritou lá da cadeira: – Zé! O hômi qué sabê o seu nome!
Pai ficou embaraçado e disse que se chamava Zé Carlos. Neste sábado, a vergonha foi tamanha que acabou a graça.
Sem trocadilhos.