Dalila, Miriã e Tafnes nasceram e cresceram sob uma rígida educação religiosa. Os nomes já apontam para referências ao Antigo Testamento. Usaram roupas compridas e largas; não brincavam com outras crianças, especialmente garotos; frequentavam a escola dominical da igreja e o tempo que dispunham depois das aulas era para ajudar a mãe nos afazeres domésticos.
Transferida para a capital do estado, a família viveu vários impactos em sua base. O custo de vida mais alto fez com que as meninas tivessem que ajudar o pai, trabalhando fora. Ele bem que resistiu, mas o dinheiro que a igreja lhe destinava para as despesas não dava.
Todos que moram nas grandes cidades sabem que há um pecado em cada esquina, uma tentação atrás de cada poste, o perigo rondando a todo instante a moral e os bons costumes, especialmente de mocinhas ingênuas vindas do interior.
Dalila, a mais velha das irmãs, foi a primeira vítima da cidade grande. Empregada em uma residência como arrumadeira, se “perdeu” com o filho do patrão, ficando grávida logo na primeira relação sexual. Também perdeu o emprego e a família, pois foi expulsa de casa.
Miriã, a segunda, arranjou emprego em uma escola de música, mas a mulher do diretor encontrou os dois nus no gabinete do marido, no repouso do “após”, e fez o maior escândalo. Naquela noite, Miriã não apareceu em casa e depois de muito procurar o pai a achou, mas preferiu dizer para a mãe que Miriã fugira.
A terceira filha do pastor, Tafnes, era o orgulho da família. Dizia ter se empregado como secretária em uma grande empresa. Saía de casa pontualmente às 7 da manhã e retornava, o mais tardar, às 13 horas. Durante a tarde fazia um curso supletivo por correspondência e, à noite, enquanto a mãe lia a Bíblia, ela ficava às voltas com cadernos e apostilas. Dizia que queria fazer o vestibular.
O pastor sempre era elogiado quando, nos dias de culto, Tafnes chegava ao templo ao lado dele e da mãe. Isso durou dois anos, até que um dia ela ficou doente e não houve remédio caseiro ou prece da congregação que a fizesse melhorar.
O estado da moça era tão grave que o pastor se resignou a chamar um médico. Vários exames foram feitos e o diagnóstico surpreendeu a todos: AIDS! Tafnes morreu poucas semanas depois da descoberta da doença.
Em seu enterro – que o pastor se recusou a acompanhar – foi descoberta a verdade. Tafnes era uma garota de programa e atendia aos clientes no turno da manhã. Quem a contaminou e para quem ela transmitiu a doença eu não sei. Só sei que essa é a triste história das filhas do pastor.
[Crônica XXXVII/2025 – Original publicado na edição de 20-24/08/1995 – Jornal Alto Madeira – Porto Velho (RO)]