O ano de 1995 já estava em sua segunda metade e estávamos ali, naquela fila, pois éramos clientes do Beron (Banco do Estado de Rondônia), que foi extinto pelo Banco Central, e precisávamos fazer o cadastro no Banco do Brasil, que assumiu os correntistas da instituição financeira exterminada pela incompetência (Epa! Isso é outra história).
Voltando ao assunto.
O lugar era o menos propício para uma declaração de amor – melhor dizendo, para uma declaração sensual – uma fila de banco, na rua, sem sombras, numa manhã quente de um domingo, dia dos pais.
Lembro que a manhã já estava avançada quando o telefone do homem na minha frente tocou e ele atendeu. Era uma ligação de um “disk-mensagens”.
Abre parênteses: Para quem não sabe ou lembra, o disk-mensagens era um serviço em que uma pessoa pagava uma taxa e enviava um recado para outro via telefone. Se fosse para celular era mais caro. Os textos variavam de acordo com o freguês, podendo ser de aniversário, declaração de amor, pedidos de desculpas, xingamentos (mais raros) ou eróticos. Você leu certo, escrevi “erótico” mesmo. Fecha parênteses.
O meu colega de infortúnio de fila atendeu ao telefone e disse que aceitava a mensagem. Quando o dito recado começou a ser lido, o homem começou a olhar para os lados, meio sem graça. Fazia gestos desconexos. Pensei que fosse uma notícia desagradável. Ele só balançava a cabeça negativamente.
Depois ele se virou para mim e fez o gesto para que eu pegasse o telefone e ouvisse. E eu ouvi uma voz sensual dizendo coisas como “sabia que você é o pai mais gostoso do mundo?” ou “passo a tarde esperando que você volte para casa para irmos para a cama…”
Devolvi o telefone e fiz um gesto de “o que é isso?” e ele, também através de mímica, pediu para que eu esperasse. A ligação durou mais alguns minutos e o cara desligou o telefone com raiva.
– Essa mulher parece que não sei! Disse se virando para mim. Eu aqui, nesta fila miserável, com esse sol queimando minha cabeça, com fome e sede, e ela ainda gasta meu dinheiro mandando uma mensagem erótica do dia dos pais! *uta que o *ariu!
– É a sua esposa? Arrisquei. Ela deve ter feito para agradar a você, disse tentando ser conciliador, mas reconhecia que o cara tinha razão. A ocasião não era propícia para falar de sexo.
– Ah! Sabe o pior? Esta mensagem não faz sentido nenhum. Não combina nem com ela, nem comigo. Tem mais. Estamos brigados, eu durmo na sala e há mais de três meses que não *repamos! Vai pro inferno! Ops! O senhor não, pelo amor de Deus, estou falando para ela.
Ele se virou novamente para frente quando a fila andou e não conversamos mais. Fiquei com aquilo na cabeça pensando no que ouvi no celular dele e no que o homem contou do casamento e pensei: “Isso foi vingança, uma nova forma de tortura: falar de sexo, quando um dos interlocutores está na fila do banco, sem sombra e nem água fresca…”
[Crônica CLXXXII/2024]