
Se foi a mãe do governador Hercílio Luz que “inspirou” ele a fazer a ponte, deve ter ocorrido um fenômeno paranormal (Imagem gerada por IA Dall-E3/Microsoft)
Nas viagens que a Marcela e eu fazemos, raramente contratamos um guia. Geralmente lemos sobre o local em que vamos visitar e isso facilita o entendimento. Na visita a São João Del Rey, em 2016, o guia fazia parte do pacote da viagem de trem entre Tiradentes e São João.
Em algumas ocasiões tive vontade de corrigir o que o guia estava contando para o grupo, mas eu apenas cutucava a Marcela. Ele inventou características do Barroco Mineiro e deu ênfase àquela lenda da “eira e beira”, que era uma forma de distinguir pessoas pobres dos ricos, apenas observando os telhados. Se tinha eira e beira, era rico, se não, pobre de marré, marré, marré.
Esqueleto do padre quando criança
Outra presepada fiquei sabendo contada pelo autor. O radialista Osmilton Avelino de Sousa, o “Paraíba”, promovia excursões de Fortaleza (CE) para outras cidades do Nordeste, e para economizar (embolsar) o dinheiro destinado a pagar o guia turístico, ele resolveu conduzir os turistas em uma visita a um museu em um dos passeios.
Sem saber nada da história e do contexto das peças que estavam expostas, o cicerone foi improvisando. “Esse esqueleto é do padre Fulano, que morreu enforcado na revolução contra os holandeses”; “Aquele quadro ali pertenceu ao príncipe Maurício de Nassau”; “Essa escarradeira foi usada por D. Pedro II, quando veio aqui em 1890 [naquela data D. Pedro II já tinha sido destronado e estava exilado em Paris]”.
Como ninguém o desmascarou, para evitar uma confusão ou por desconhecer a História, o falso “guia” foi mentindo até a saída do museu, onde havia um esqueleto pequeno, certamente de uma criança. Um dos visitantes perguntou: “E essa caveira aqui, Paraíba, de quem é?” Sem prestar atenção ao que era, respondeu: “É a caveira do padre Fulano, que morreu enforcado na revolução…”
– Oxente! Mas nós já vimos a caveira do padre Fulano! Essa aqui é pequenininha!
– É a caveira do padre quando ele era moleque!
Aí não teve mais jeito e o guia de araque correu para não apanhar.
A mãe do governador e a ponte
Antes da ponte Hercílio Luz – inaugurada em 1926 – a travessia entre a Ilha de Santa Catarina e o continente era feita em barcos, bateiras e balsas, mas se o mar estivesse encrespado, as pessoas tinham que se arranjar na ilha ou no continente e esperar as águas acalmarem para transpor o canal.
Ao assistir a uma entrevista de um guia turístico sobre a ponte Hercílio Luz, algo me soou estranho. Ele disse que costuma divulgar uma lenda em que a senhora mãe do governador Hercílio Luz, ao atravessar o canal, de barca, indo do continente para a ilha, ficou toda molhada por causa do vento que jogava água do mar nos passageiros.
Ela teria ficado brava e dito a Hercílio Luz: “Meu filho, você é o governador, dá um jeito de construir essa ponte logo!”. E Hercílio Luz, como um bom filho, mandou fazer os estudos para a construção da dita ponte.
Não foi difícil desmentir essa lenda. Bastou que eu pesquisasse as datas: a mãe do governador Hercílio Luz (1860-1924) foi a senhora Joaquina Ananias Xavier Neves da Luz, que nasceu em 1831 e morreu em 1884. O início do projeto da ponte foi em 1920, as obras começaram em 14 de novembro de 1922.
Ou seja, o projeto foi iniciado 36 anos depois da morte da dona Joaquina e a obra, 38 anos após a morte.
Se houve a conversa que o guia divulga, só pode ter sido um fenômeno paranormal.
[Crônica CXLV/2024]