16 de setembro de 2024

Entre o garimpo e a zona – A resenha de hoje

Por José Carlos Sá

A história dos garimpos em Rondônia se confunde com a história da colonização do estado (Divulgação)

Eu li esse livro ouvindo mentalmente as músicas citadas no texto pelo autor, o amigo jornalista Montezuma Cruz. Tocaram na minha jukebox imaginária a trilha sonora que era executada nas boates, bares e também nas rádios na década de 1980, quando se passa a maior parte das aventuras narradas. 

Os estilos eram poucos, se escolhia entre brega e forró. Os destaques eram Reginaldo Rossi (“nesse corpo meigo e tão pequeno há uma espécie de veneno…”), Trio Parada Dura (”As andorinhas voltaram, eu também voltei…”) Fernando Mendes (“Numa tarde tão linda de sol, ela me apareceu…”) e a “prata da casa”, o radialista Vivaldo Garcia, com a sua “Melô do pacu” (“Menina do pacu grande, dá esse pacu pra mim…”). 

Estas fotos de balsas e dragas no rio Madeira são de 2021. Na época que o livro retrata, eram em número muitas vezes maior (Foto Bruno Kelly/Greempeace/Reprodução)

Deixei que o Monte me guiasse até o Trevo do Roque, na entrada de Porto Velho para quem chega na cidade pela BR-364, vindo de Mato Grosso ou do Acre. No Roque e região se concentravam as boates, hotéis e pensões de alta rotatividade (como se chamam esses estabelecimentos em Belo Horizonte). Era ali que os garimpeiros buscavam companhia e distração, ao preço de alguns gramas de ouro.

As histórias que o Montezuma relembra servem para ilustrar a época em que garimpar ouro e cassiterita foi o principal atrativo para que aventureiros de todo país aportassem em Rondônia. Os ciclos do minério são uma fase importante na história do Estado – desde que era Território Federal – e ainda sobrevivem nas curvas do cada vez mais seco Rio Madeira.

Histórias marcantes

Cheguei a Porto Velho em 1986 e acompanhei, de longe, várias histórias que o Montezuma garimpou entre as centenas de reportagens que ele escreveu quando trabalhava como correspondente de jornais como Folha de S. Paulo, Jornal do Brasil e como repórter dos jornais regionais A Tribuna, O Guaporé, O Estadão de Rondônia, O Parceleiro, Diário de Rondônia e O Imparcial. 

Obra “O garimpeiro 1”, de Rafael do Prado (Divulgação)

Conheci algumas personagens citadas no livro, pessoalmente e por fama, e relembrei fatos que acompanhei pelos jornais da época, como a chamada “Chacina do Palmeiral”, em que um grupo de policiais militares foi acusado de executar oito garimpeiros e ferir outros três, que estavam em litígio com uma empresa que se dizia dona da concessão para exploração mineral no local onde aconteceram os fatos.

Há narrativas, em primeira pessoa, colhidas pelo autor, que são comoventes, como a do menino de nove anos que viu o pai mergulhar no Madeira para garimpar e morreu soterrado no fundo do rio. 

Em outra história, um candidato a garimpeiro de cassiterita na região de Ariquemes (garimpo do Bom Futuro ou o garimpo da Linha C-75) ao descer do caminhão pau-de-arara que o levou até a entrada da “maior mina de cassiterita a céu aberto do mundo” (na época), assistiu a uma cena deprimente que o fez mudar de ideia e voltar para casa. Nos fundos da lanchonete onde parou para tomar um refrigerante, havia uma fila formada por 25 homens. Eles esperavam a vez de fazer sexo com uma mulher. Era só uma prostituta que estava na função naquele dia e cada cliente tinha direito a cinco minutos de prazer.

“Território Dourado – Histórias sinceras do garimpo de ouro, violência nas currutelas, apogeu e queda da zona boêmia porto-velhense” traça um paralelo entre a história da colonização de Rondônia, incentivada durante o governo militar (1964 – 1985) com a égide “Integrar para não entregar”, e as descobertas e exploração de minérios em seringais, terras devolutas e nos cursos de rios. Mostra a ação de grandes empresas nacionais ou estrangeiras, que queriam explorar a região e os aventureiros em busca de se tornarem ricos, mas que só encontravam a morte ou a desgraça.

O livro pode ser adquirido com o autor, pelo e-mail montezumarondonia@mail.com. O preço de cada exemplar é R$ 40,00. Em caso de envio pelos Correios, o custo da postagem já está incluído.