15 de agosto de 2024

Túnel para lugar nenhum

Por José Carlos Sá

O túnel – assinalado pelo círculo – fica em um cantinho do Parque das Esculturas (Foto JCarlos)

Quando eu estava pesquisando lugares para visitar no retorno da nossa viagem a São Francisco do Sul, no final de semana passada, elegi Brusque como o nosso destino e relacionei algumas atrações (que deveriam estar abertas na segunda-feira). Entre os destinos turísticos encontrei a indicação de visita ao Parque das Esculturas. Em um dos comentários, havia a sugestão de “explorar o túnel que fica em um cantinho do parque”.

Não há indicações sobre o túnel (Foto JCarlos)

A galeria subterrânea está limpa e a entrada é iluminada pela luz natural (Foto JCarlos)

No local não há nenhuma informação sobre o túnel. Tudo estava limpo e a iluminação era apenas a que vinha do exterior. Soube depois que a estrutura tem cerca de 250 metros de extensão, quase toda percorrida por nós. Na outra extremidade, galhos fechavam, parcialmente, a abertura. 

A luz no fim do túnel engana (Foto JCarlos)

O túnel do Mont Serrat é um paradoxo àquela expressão de esperança de que sempre existe “uma luz no fim do túnel”. Lá, você vê a luz no final da galeria subterrânea, mas a claridade serve apenas para saber que não há saída.

Ferrovia imaginária

Pesquisando com quem sabe da história, encontrei que o túnel é o que resta do antigo sonho do empresário alemão e cônsul honorário da Holanda no Brasil, Carlos Renaux (Karl Christian Renaux), pioneiro da indústria de fiação em Santa Catarina. Ele pretendia construir uma ferrovia de Brusque ao porto de Itajaí para permitir o escoamento da produção.

Abertura do túnel de Mont Serrat, anos 1950 (Foto Acervo Blog Brusque Memória / Reprodução)

Apesar de o governo imperial oferecer concessões para a construção da ferrovia, a ideia só prosperou com a exploração de calcário (matéria prima para o cimento) em Botuverá. O minério era transportado em vagonetes suspensos em linhas aéreas até Brusque, onde deveria ser embarcado em vagões ferroviários e seguir para o litoral.

Abertura do túnel de Mont Serrat, anos 1950. Uma curiosidade anacrônica: Os operários Esteu Vinotti (esq) e Alécio Peixe trabalhavam descalços no canteiro de obras (Foto Acervo Blog Brusque Memória / Reprodução)

Para concretizar a ideia, entre as décadas de 1940 e 1950, foi iniciada a perfuração de um túnel sob o Mont Serrat, por onde a linha férrea passaria. Faltando poucos metros para a conclusão do acabamento do túnel, a obra foi interrompida e abandonada.

Os trilhos, em primeiro plano, serviam para as caçambas que retiravam os resíduos da escavação (Foto Foto Acervo Blog Cantinho da Bagunça / Reprodução)

Com a construção da rodovia Antônio Heil (BR-486), a partir de 1969, o túnel foi soterrado, tendo sido reaberto em 1990. Segundo a professora Rosemari Glatz, “da ideia da ferrovia o que nos resta é apenas o túnel do Mont Serrat, (…) e por onde jamais um trem passou.”

O que fazer com aquilo?

Quando o Parque das Esculturas foi implantado em 2001, o projeto era que o túnel fizesse a integração do parque com o planetário e um observatório. Dos três itens, só o parque saiu do papel.

De acordo com um dos funcionários do parque – que encontrei na pesquisa – Odir Barni, alguns empresários já procuraram a Prefeitura de Brusque com propostas de fazer o túnel de adega para armazenagem e conservação de vinhos; outro quer instalar ali uma galeria de arte; enquanto o seu Odir sugere que seja feita um restaurante para atrair mais visitantes ao parque.

Enquanto nenhuma dessas ideias tiram o túnel do seu ostracismo, a colocação de uma placa informativa não vai custar (quase) nada, né?

[Crônica CVI/2024]