24 de julho de 2024

Acidentes aéreos na barbearia

Por José Carlos Sá

Um avião T-25 igual ao modelo que o Ricardo e eu lavamos. A tomada de estática está marcada com o círculo (Foto FAB/Reprodução)

O assunto na barbearia era o nevoeiro forte que cobre a região onde moramos quase todas as manhãs desde a semana passada. No sábado, 20 de julho, a situação foi mais grave, com o fechamento do aeroporto internacional de Florianópolis.

Da neblina – mas mantendo o tema “aviação” – a conversa derivou para acidentes aéreos recentes e um dos “especialistas” presente sugeriu a instalação de um paraquedas gigante nos aviões e explicou como funcionaria: “O paraquedas fica guardado, quando o piloto vê que o avião vai cair, aperta um botão, o paraquedas abre e o avião chega suave ao solo”.

O barbeiro que me atendia falou baixinho: “Isso aí ia funcionar para aviãozinho pequeno, queria ver [o paraquedas funcionar] em um Boeing!”. Sorri concordando. Mas já tinham avançado e falavam sobre os mecânicos de avião: “O avião tá lá no céu, mas a oficina e o mecânico ficam na terra… Não dá certo!”. “Mas como o mecânico ia consertar o avião no ar?”. “Sei de uma história do tempo da guerra em que o cara falava assim: ‘Já derrubei vinte aviões’. ‘Você foi piloto de caça?’ ‘Não, mecânico de avião’”. A barbearia caiu na gargalhada.

Água na tomada estática

Quando meus colegas de barbearia falaram em “derrubar aviões”, me lembrei de um fato da minha época do serviço militar na Força Aérea.

O soldado 23 – Ricardo – e eu, após a fase de incorporação à Aeronáutica, fomos designados para trabalhar no hangar da Base Aérea de Belo Horizonte. Nossa função era “pilotar” dois carrinhos de mão, vassouras e espanadores e manter tudo limpo.

Além de limpar os prédios onde eram guardados os dois aviões – um T-25 e um C-42 – também tínhamos que retirar e guardar do hangar as duas aeronaves e mantê-las limpas. Para isso, enquanto um usava a mangueira para jogar água, o outro, armado com uma vassoura de cerdas macias, espalhava sabão neutro sobre a fuselagem.

Ficamos pouco tempo nessas funções e logo fomos transferidos para o DPV (Departamento de Proteção ao Voo), que funcionava em outro lugar, fora da Base Aérea. Mas antes da mudança, porém, quase provocamos um acidente aéreo.

É que enquanto lavávamos o T-25, o 23 descobriu que havia dois buraquinhos, um de cada lado da fuselagem. Por tentação do capeta (dizem que “soldado é a imagem do cão”), ele pressionou a mangueira em um dos buracos e pediu para eu olhar se a água estava saindo do outro lado. Com a resposta positiva, continuamos o serviço e nos esquecemos dessa experiência (hum…) científica, vamos dizer assim.

No dia seguinte soubemos que o comandante da Base e outro oficial decolaram com o T-25 e tiveram que fazer um pouso de emergência logo em seguida, pois os instrumentos de voo ficaram malucos.

A pane encontrada foi a presença de água na “tomada de pressão estática”, aquele buraquinho na fuselagem, que serve, junto com outro instrumento chamado “pitot”, para medir a velocidade e a altitude do avião”.

Felizmente não houve um acidente e juramos, por Santos Dumont e por Deus, que não fomos nós que enchemos o negócio com água.

[Crônica XCXII/2024]

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Acidente aéreo Aeroporto de Florianópolis Base Aérea de Belo Horizonte C-42 Santos Dumont T-25 

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