10 de junho de 2024

Quando eu virei ‘Seu Chico’

Por José Carlos Sá

Eu sempre estava usando roupa social e era conhecido internamente como ‘Sr. Chique’ (Imagem gerada por IA – Copilot/Microsoft.Com)

Uma vez comprei duas revistas para colorir, ajudar alguma instituição, e as dei para a garçonete do bar que eu frequentava levar para os filhos dela, uma menina de oito anos e um menino de uns cinco. 

Algum tempo depois recebi um bilhete manuscrito pelo menino agradecendo o presente. Chamou minha atenção, além das garatujas, ele ter me chamado de “Seu Chico”. Quis saber que história era aquela de “seu Chico”, já que ela, mãe do menino, sabia o meu nome.

Caderno de referências

A explicação, meio envergonhada, foi a seguinte: era costume entre os garçons anotar em um papel (no caso dela era um caderno) uma referência dos fregueses para não confundir os pedidos e fazer o controle do consumo. Como naquele bar as mesas não eram numeradas, a indicação usada era uma característica do cliente. Física ou moral.

No caderno da Mônica, a garçonete, eu era o “Seu Chique”, pois vestia habitualmente camisa de manga comprida e calça social, que eram o meu uniforme diário, e isso me distinguia no bar. 

Então, quando ela chegou em casa com as revistinhas de colorir, disse aos filhos ter sido o “Senhor Chique” que enviou os presentes. O menino, que não sabia o que significava “chique”, escreveu no bilhete de agradecimento “Seu Chico”.

Agradeci a consideração e, curioso, pedi para ver o tal caderno com as referências. Ela relutou, mas trouxe as anotações. Ri muito dos registros e identifiquei alguns dos clientes: “Camisa verde”, “Óculos de fundo de garrafa”, “Enxerido”, “Nervoso”, “Apressado”, “Fala alto”, “Mal educado”, “Dá gorjeta”. Encontrei uma anotação que pedia  explicação. Estava escrito “Dois *us”!

– Ah, seu Zé Carlos – disse ela -, são  dois sujeitos que vêm aqui de vez em quando e me desrespeitam, perturbam mesmo. Querem me passar a mão, fazem convites… No dia que eu estiver ‘boa’ vou dar umas cadeiradas neles. Não sabem com quem estão mexendo…

Pouco tempo depois, o bar fechou e a Mônica foi trabalhar no próprio restaurante, montado pelo marido dela, que era o cozinheiro no bar dessa história. 

[Crônica LXXVI/2024]

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Bar Porto Velho 

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