
Monumento aos catarinenses mortos na Guerra do Paraguai, no centro de Florianópolis. Em primeiro plano, o busto do artista plástico Victor Meirelles, que nasceu na antiga Desterro (Foto JCarlos)
Desde que eu vi pela primeira vez o “Monumento aos Voluntários da Guerra do Paraguai”, também chamado de “Monumento em homenagem aos catarinenses mortos na Guerra do Paraguai” ou “Coluna Comemorativa”, notei que aquela construção tinha algo de estranho, de inacabado. Impressão que se renovava a cada vez que eu passava pela praça 15 de Novembro, no centro de Florianópolis, e olhava para a coluna.
Ao ler o livro “Santa Catarina – A ilha”, do Virgílio Várzea, encontrei a história daquela que seria a homenagem aos quase 1500 (ou 300? As fontes são divergentes) catarinenses que foram recrutados pelo Império, na província catarinense, para o esforço de guerra no Paraguai, entre 1864 e 1870, e morreram no confronto.

Praça 15 de Novembro – centro de NS do Desterro, hoje Florianópolis, em 1890 (Foto Acervo IHGSC/Reprodução)
Segundo Virgílio Várzea, a iniciativa da construção do monumento foi do presidente da Província João Thomé da Silva (1873 a 1875). Ele apelou às subscrições públicas para custear o projeto, que foi elaborado pelo engenheiro agrimensor búlgaro Carlos Othon Schlappal, e constava de um “obelisco imponente, com de 20 metros de altura, que chamaria atenção já das ruas próximas a praça”. O início da obra, já nos meses finais da administração de Thomé da Silva, foi inaugurado com festa. Mal o pedestal ficou pronto, o governador foi chamado à Corte, no Rio de Janeiro, e destituído do cargo por motivos que não sei quais foram.
O esqueleto da obra inacabada com os respectivos andaimes ficou por muito tempo abandonado na praça, demonstrando que no Brasil não há continuidade de obras da iniciativa de um governador pelos sucessores. É cultural.
Bombas ao invés de estátua
A ideia do monumento aos catarinenses mortos na guerra do Paraguai só foi retomada quando assumiu o governo o Visconde de Taunay – Alfredo d’Escragnolle Taunay – que também lutou na Guerra do Paraguai como major e ajudante de ordens do então comandante-geral Conde D‘Eu.

Homenagem ao coronel Fernando Machado de Souza, desterrense, morto na batalha de Itororó em 1868 (Foto JCarlos)
Taunay conseguiu terminar a obra, com o tamanho reduzido à metade do que estava previsto – projetado para ter 20 metros de altura e ficou com 10,88m. No relatório de prestação de contas das ações como governador, ele lamentou não ter tido recursos para concluir, como queria, o monumento aos que morreram no Paraguai. Ele pretendia que a coluna servisse de base para a estátua do coronel Fernando Machado de Souza, morto na batalha de Itororó em 1868, que hoje está instalada na praça de mesmo nome, contígua à praça 15 de Novembro, em direção ao mar.
Com a falta de recursos, Taunay apelou para a criatividade e conseguiu do então presidente do Conselho de Ministros de D. Pedro II, o Duque de Caxias, que fossem fornecidas as “bombas, correntes e mais acessórios”, que serviram de arremate ao monumento, que o próprio Taunay se envergonhava do resultado. Muito tempo depois de ter deixado o cargo de presidente de Santa Catarina, o assunto ainda o incomodava: “(…) procurei fazer com que se substituísse aquela desgraciosa pilha de balas [de morteiro] por uma estátua de bronze de Santa Catarina, mas custava 35 contos de réis em uma casa em Estrasburgo [na época a cidade pertencia à Alemanha]”.
No monumento que vemos hoje, há uma relação de cinquenta e um oficiais, desde a mais alta patente, o marechal-de-campo Guilherme Xavier de Souza, ao menos graduado, o segundo tenente Feliciano Nunes Ayres. Os outros praças, sargentos, cabos e soldados, que foram recrutados entre os agricultores pobres e os escravos “doados” à Nação, não mereceram a mesma distinção e devem ter se sentido ‘homenageados’ através de seus comandantes. Ou não.
[Crônica LXXI/2024]