Antes de contar esse causo ocorrido no final da década de 1970, quero fazer uma constatação: toda vez que ignoro meus princípios, eu me dou mal. Isto posto, vamos à história.
Após o final da festa junina da Unidade Gameleira, do Colégio Tiradentes de Belo Horizonte, de madrugada, eu e um grupo de amigos residentes em Bernardo Monteiro (Contagem) fizemos a pé um percurso de aproximadamente três quilômetros até a praça Louis Ensch (mais conhecida como praça da Magnesita), na Cidade Industrial, onde aguardaríamos o primeiro ônibus para voltarmos para casa. Era a primeira vez que eu saia com eles.
Eu tinha bebido cerveja e não fui ao banheiro antes de sair da festa. Estava apertado e a vontade de urinar foi crescendo à medida em que caminhava. Não sou adepto de mijar em qualquer lugar, e na avenida Amazonas não havia onde eu me esconder para fazer um discreto xixi.
Fui andando e tentando conciliar estas duas coisas inconciliáveis, sem ver solução. Estava com vergonha das meninas, mas sem conseguir convencer a bexiga a aguardar mais um pouco.
Na última etapa da caminhada, a uma quadra da parada de ônibus, vi uma banca de jornais que surgiu para mim como um oásis surge para um tuaregue: a salvação. Deixei os colegas se adiantarem, me encostei na banca, de costas para a rua, e comecei a me aliviar.
Não tinha ainda vertido metade da urina quando ouvi alguém, atrás de mim, dizer de forma agressiva:
– Tanto lugar para mijar e você vem mijar na minha banca!
Me assustei, tentei cortar um fluxo, mas foi inútil. Era como disse o escritor americano John Green: “Fazer xixi é como um bom livro, pois é muito, muito difícil parar depois de começar.”
Quanto mais ele me xingava, eu continuava a urinar, um mijo que parecia não ter fim, até que todo o conteúdo se foi. Fechei a braguilha e, cabisbaixo e envergonhado, apressei o passo para sair dali e alcançar meus colegas. Não contei nada a ninguém e sempre que passava pela banca de revistas pedia desculpas mentais ao proprietário: “Foi mal!”.
[Crônica LXVII/2024]