Chico Bittencourt (Cebê), um conhecido meu, tinha um pequeno sítio na área rural de Porto Velho (RO) onde passava os finais de semana com a família. Era um mês de abril como esse quando ele se deu conta que precisava contratar alguém para roçar a gleba, pois sozinho não daria conta, e o mato não dava trégua.
Decidido a encontrar alguém por ali mesmo, foi ao bolicho do Gaúcho onde indicaram o Zeca de Noca, morador da mesma região, que costumava pegar algumas empreitadas. Cebê foi até ele e ofereceu o serviço. Seria uma limpeza maior desta vez e depois só a manutenção. Zeca deu o preço e pediu o dinheiro adiantado, pois “as coisas não tão boa aqui em casa. Falta até o sal”. Foi atendido.
Bittencourt teve que viajar a serviço e ficou mais de um mês sem ir ao sítio, quando finalmente apareceu, o mato estava grande. Nada havia sido feito desde a última vez que estivera lá.
Foi à casa de Zeca de Noca, mas o menino que atendeu disse que o pai tinha mandado dizer que saíra cedo e não sabia quando voltaria. Cebê deixou um recado para que Zeca fosse conversar com ele e explicar por que não havia cumprido a empreitada para o qual foi contratado e pago.
Certo de que havia jogado dinheiro fora, Chico contratou outra pessoa para fazer o roçado. Nas idas e vindas ao sítio, de vez em quando cruzava com o Zeca de Noca, que não tendo como se esconder, ficava parado no lado da estrada como se fosse parte da paisagem. De sacanagem o Chico inventou um bordão para cumprimentar o tratante toda vez que o visse: “Oi seu Zeca, bom dia! De setembro não passa!”
Quando me contou esse causo, perguntei ao Chico o porque de setembro. Ele não sabia. Disse que a palavra surgiu quando viu Zeca de Noca pela beira da estrada, fingindo que não estava lá. “Disse setembro, como poderia dizer ‘ano que vem’ ou outra coisa qualquer”.
Mas o melhor da história – ou o pior – é que no final do mês de julho daquele ano, Zeca de Noca apareceu morto perto do rio onde pescava. Apesar de o IML (Instituto de Medicina Legal) ter emitido um laudo apontando uma cirrose hepática como a causa da morte, Chico Bittencourt passou a ser considerado um feiticeiro pelos vizinhos.
A sorte dele é que naquela época ainda não havia surgido a internet com suas redes sociais implacáveis.
[Crônica XLVII/2024]