A “descoberta” de 261 bens patrimoniais públicos que estavam destinados para uso do presidente da República e seus familiares foi o assunto da imprensa esta semana. Os bens eram dados como desaparecidos quando da troca de mandatários no ano passado. Nem vou comentar as despesas que foram feitas para a reposição dos móveis pelos novos moradores.
Com um levantamento mais criterioso, os itens faltantes foram encontrados “em dependências diversas” do próprio Alvorada. Pedidos de desculpas são desejáveis e necessários.
Eu passei por isso e sei a raiva que dá ser apontado como culpado daquilo que você não fez. No período de 1º de janeiro de 1999 a 31 de dezembro de 2002, fui secretário-executivo do gabinete do vice-governador de Rondônia e responsável pelo patrimônio permanente que estava à nossa disposição.
No decorrer do período de governo, o local onde funcionava a Vice-Governadoria se mudou três vezes, a nossa pequena equipe fazia regularmente a conferência do patrimônio e enviava relatórios a quem de direito. Também recebíamos as visitas surpresa do pessoal da Controladoria-Geral do Estado, que fazia checagens aleatórias.
Terminado o período do mandato ao qual eu servia, voltei para minhas atividades na iniciativa privada, até que um belo dia – quase um ano depois – recebi uma intimação para comparecer perante uma Comissão de Inquérito que apurava denúncias. Tomei o maior susto. Tinha consciência de que não corrompi ninguém (e nem fui corrompido), não pratiquei concussão nem advocacia administrativa e não prevariquei. O que poderia ser?
No dia seguinte encontrei a comissão completa me esperando: presidente, secretário e mais um membro. Depois das formalidades de apresentação ouvi a leitura da peça de acusação.
A então chefe de gabinete da vice-governadora enviou um ofício à Controladoria em que denunciava o sumiço de diversos móveis, itens constantes na lista de patrimônio do gabinete e que fora assinada por mim. Na lista tinha de tudo: central de ar-condicionado e de PABX, móveis inteiros e modulados, cadeiras, poltronas e uma cacaria sem fim.
Pedi um prazo para verificar onde foram parar os itens sumidos, e saí da reunião direto para onde funcionava a Vice-Governadoria. Na equipe de apoio ainda havia funcionários que trabalhavam comigo e pedi a eles que me ajudassem a localizar os itens desaparecidos.
O tempo gasto para localizar os objetos dados como sumidos foi apenas o necessário para se pegar a chave do depósito e atravessar o pátio. Tudo estava lá, com exceção dos aparelhos de refrigeração, que faziam parte de uma central de ar-condicionado, instalados de forma definitiva em um dos prédios do Governo Estadual onde o gabinete funcionou.
Liguei imediatamente para o presidente da Comissão e pedi para que me recebesse no dia seguinte, pois eu já tinha resolvido o caso do sumiço. Ele não acreditou.
Na manhã seguinte levei as fotos dos móveis e objetos dados como desaparecidos, fiz constar em ata a má-fé da chefe de gabinete e pedi que fosse enviado a ela o resultado do inquérito e as minhas declarações. Ainda ameacei entrar com um processo judicial contra o Estado de Rondônia, o que não fiz.
[Crônica XXXIV/2024]