29 de dezembro de 2023

Presépio de Pipiripau – Uma das maravilhas de Belo Horizonte

Por José Carlos Sá

Presépio do Pipiripau, com 580 figuras 45 cenas. Conta a história de Jesus Cristo do nascimento à ressurreição e mostra aspectos da cidade de Belo Horizonte sob o ponto de vista do criador da obra, seu Raimundo (Foto JCarlos)

Há coisas que você sabe que existe, tem curiosidade de conhecer, mas as oportunidades para isso não se apresentam e aquele interesse vai ficando para trás. Assim é a minha história com o Presépio Pipiripau. Quando nós morávamos em Belo Horizonte o dinheiro não dava para as despesas (quatro ônibus e mais as entradas) para cinco crianças e mais mãe que nos levaria. Depois a própria vida se encarregou de determinar minhas prioridades e só fui conhecer pessoalmente o Presépio de Pipiripau agora, em novembro, junto com a Marcela.

História

Raimundo Machado de Azeredo [*1894 +1988] começou a história do presépio com uma imagem de Jesus menino, enfeitado com cabelo sde milho e lírios do mato (Reprodução)

O Presépio de Pipiripau começou ser construído em 1906, quando Raimundo Machado de Azeredo tinha 12 anos. A familia dele foi morar na Colônia Américo Werneck, numa região conhecida como Pipiripau, que hoje é o bairro Sagrada Família, em Belo Horizonte. Ele via presépios nas igrejas e em casas vizinhas e resolveu fazer o próprio. Vendeu garrafas e com o dinheiro comprou a imagem do Menino Jesus e foi construindo o presépio a partir daí, não parando mais até morrer, aos 93 anos, em 1988. No presépio do seu Raimundo ele não se contenta apenas em contar a história do nascimento, mas resume toda a vida de Jesus que é narrada nos  Evangelhos, usando para isso 586 figuras divididas em 45 cenas.

Algumas cenas, da esq. para a dir.: Jesus com os sábios no templo; suicídio de Judas; o sanfoneiro (?) e uma tropa militar mineira (Fotos JCarlos)

Oficina do Seu Raimundo foi montada na UFMG ao lado da exposição do presépio (Fotos JCarlos)

A última ceira (Foto JCarlos)

Outro diferencial desse presépio são os movimentos das figuras feitas com papel machê, argila e madeira, que se movimentam movidas por uma série de objetos de todaordem, como arames, fios de nylon, carretéis, barras de ferro, polias, peças de relógio e “tudo quanto há”, como diz minha mãe. A engenhosidade do autor é de espantar.

Ele teve formação autoditata, tendo estudo apenas o Curso Primário. Trabalhou como balconista, foi funcionário da Prefeitura de Belo Horizonte e da Ferrovia Central do Brasil, onde obteve conhecimentos de mecânica, tendo se aposentado na Imprensa Oficial do Estado de Minas. Com a aquisição do Presépio dele pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), foi contratado para dar manutenção à sua obra. Também treinou dois técnicos para continuarem o trabalho.

Licença poética

Impressionam, além dos movimentos, o sincronismo das cenas. Você pode acompanhar Jesus Cristo do nascimento à ressurreição, como se fosse um filme em que a ordem cronológica dos fatos são obedecidas. Mas o cenário é amplo e outras coisas acontecem ao mesmo tempo, mesmo estáticos: pescador em atividade, madeireiros derrubando árvores, criança passeando de canoa, pastores levando ovelhas, além de inserir cenas da Belo Horizonte que seu Raimundo viu crescer: o Parque Municipal, a fonte da praça Raul Soares, a tropa de militres que guradava as estradas e a Igreja da Sagrada Família.

Licença poética: Seu Raimundo inseriu cenas do cotidiano da cidade no presépio – Parque Municipal de Belo Horizonte (Foto JCarlos)

Esse é o Presépio de Pipiripin, usado para distrair os visitantes nos intervalos de exibição do presépio principal (Foto JCarlos)

No entanto, o ponto alto da apresentação  do Presépio do Pipiripau não é a ressurreição de Jesus ao terceiro dia, mas a morte dele na sexta-feira. O seu Raimundo reservou para o grand finale um espetáculo de arrepiar. É avisado antes que as pessoas mais sensíveis devem deixar a sala, que fica com as portas abertas.

Não sei como os efeitos são produzidos, mas a tempestade que se forma sobre a Jerusalém cenográfica impressiona. Além das luzes estroboscóbicas, representando com clarões os relâmpagos, raios, coriscos e faíscas, é produzido o som apavorante de trovões, daqueles que parecem que o céu está caindo.

Sensacional. Perdi tempo em não ter indo visitar antes.