
A capa do livro reproduz a tela ‘Pescador solitário no rio’, do artista japonês Ma Yuan (por volta do ano 1220) e combina bem com o conteúdo (Foto JCarlos)
A Marcela ganhou o livro hai quase – em minúsculas mesmo – da autora Lilian Schmeil (Editora Estúdio Semprelo, Florianópolis, 2021), na oficina “Poéticas do afeto – escritas para o fim do mundo” promovida pelo Sesc, da qual participou. A autora, formada em sociologia, com especialização em antropologia social, é professora e atuou na Fundação Franklin Cascaes.
Eu abri a publicação e já fui conquistado pelo primeiro poema que li: o vento tece / a dança sexy / da minha saia. Os demais 129 haicais seguem na mesma linha entre o erótico e o saudoso, entre as insinuações e as memórias, entre a natureza e os sentimentos. Resultado, li toda a obra, que é muito leve e saborosa, de um só fôlego. Gostei e recomendo.
Outras amostras do trabalho da Lilian Schmeil, escolhidos aleatoriamente entre os “quase” haicais:
saliva com saliva
nenhuma lingua
mais é minha
tarde nua
todas as noites, de manhã
são tuas
vida curta
o destino de um mosquito perdido
numa pele quente
essas mãos
em horas vagas
vagalume
Haicai em mim

Esse haicai ficou marcado em minha memória desde que o vi pela primeira vez. Publicação de 1986, originalmente nas páginas da revista Veja (Reprodução Itau Cultural)
Tenho uma especial predileção pelos haicais desde que os “descobri” lá pela década de 1970, quando esse estilo de poesia (vindo do Japão, onde é muito comum) ficou mais conhecido no Brasil com a divulgação de trabalhos do poeta “marginal” Paulo Leminski. Também encontrava haicai nos trabalhos do Millor Fernandes publicados na revista Veja e n’O Pasquim. Destaco um poema do Millôr em particular: “Na poça da rua / O vira-lata / Lambe a Lua”.
A uma certa altura da vida também tentei cometer haicais, mas o bom senso predominou e abandonei a ideia, ficando apenas como um leitor atento desse gênero de poesia.