A frase “se Deus quiser” é usada por nós em várias situações: Como desculpa, como determinismo e para dizer que o nosso futuro não nos pertence. Pensei nisso ao ouvir uma pessoa dizer que tomou uma decisão “porque Deus queria” e que ele (narrador) precisava agir daquela maneira. O bordão me remeteu ao passado, há mais ou menos 20 anos.
Eu trabalhava no consórcio que fazia os estudos prévios para a construção das usinas do rio Madeira, Jirau e Santo Antônio. Paralelo à ação dos técnicos em várias áreas – biólogos de todas especialidades, médicos, topógrafos, geólogos etc. etc. – havia a apresentação de palestras dirigidas às populações das áreas que seriam afetadas, autoridades civis, militares e eclesiásticas (demorei mas usei essa palavra!) e imprensa.
Uma dessas palestras foi realizada na Câmara Municipal de Guajará-Mirim, na fronteira do Brasil com a Bolívia. Após a exposição feita pelos técnicos Afonso Goulart e Acyr Gonçalves, começou a série de perguntas e dúvidas levantadas pela comunidade.
Já no final da sessão se levantou uma senhora – que acredito era uma freira – e perguntou – E se a barragem se quebrar?
Os palestrantes disseram que as empresas envolvidas no projeto tinham ‘expertise’ internacional e haviam construído barragens e hidrelétricas em todo o Brasil e em vários países, que os projetistas e engenheiros envolvidos eram altamente especializados.
Ela insistiu: – Mas a barragem pode se romper!
Os representantes do consórcio reforçaram a qualidade técnica do projeto, que era supervisionado por auditorias independentes e internacionais, além do acompanhamento de órgão brasileiros como o Ibama, Ministério Público Federal e Estadual.
Mas a senhora não se convenceu:
– Mas e se Deus quiser que [a barragem] quebre ?
Já sem paciência, o Acyr respondeu: – Aí não temos mais nada o que fazer. Eu morro, a senhora morre, vai tudo de água abaixo!