Desde segunda-feira (1° de agosto) os recenseadores estão nas ruas do Brasil, batendo de porta-em-porta para contar a população e colher alguns outros parâmetros que servirão de orientação e base para políticas públicas. Se os nossos administradores quiserem, as informações estarão disponíveis.
Como observador privilegiado – um infiltrado, poderiam dizer – estou atento para relatar o que vejo ao meu redor ou que fontes seguras me contam, respeitando o sigilo institucional que precisa e deve ser observado.
Desde o treinamento dos supervisores censitários, o time em que estou escalado, venho colecionando fatos e diálogos para incluir em crônicas.
Quem vai buscar é a Federal
Um colega que fazia pesquisa de entorno (situação da infraestrutura dos bairros) foi abordado por três jovens armados de pedaços de madeira. Eles queriam o tablet em que eram registrados os dados colhidos pelas ruas que percorria. Com sangue-frio, o supervisor disse que tinha apenas vinte pilas no bolso e o equipamento era do Governo Federal. “Vocês podem levar, mas esse aparelho está sendo rastreado e quem vai buscar é a Federal…” Os amigos do alheio só levaram a grana do rapaz.
Data de referência
Para definir um padrão de questionário para todo país, entre outras coisas, o IBGE adotou a “data de referência”, estipulando que seria a zero hora do dia 31 de julho para 1⁰ de agosto de 2022.
Então, “devem ser recenseadas todas as pessoas que moravam no domicílio na data de referência”. Foi usada uma analogia para fixar esse conceito: Imaginar que foi feita uma fotografia dos moradores daquele domicílio na virada de 31 de julho para 1⁰ de agosto. Quem aparecesse na foto seria contado.
Explicado isso uma candidata a recenseadora levantou uma questão pertinente: Quem vai fazer esta foto? (Ainda estávamos em julho) A foto vai ser feita por um satélite? Tipo pegando o Brasil todo? Expliquei que a “foto” era só um artifício para facilitar a aprendizagem. “Ah! – disse ela aliviada – então eu não terei que tirar a foto…”
Você trabalha pro Lula
A colega fazia a coleta de entorno, verificando se as ruas eram pavimentadas, se tinham rede pluvial, iluminação pública, para de ônibus e etc., quando se encontrou com um casal. A mulher apontou para a agente do IBGE e falou para o acompanhante: “Olha aí, eu não te disse? É o pessoal do Lula pedindo votos!”
A ibgeana tentou explicar o que fazia, mas a mulher se exaltava cada vez mais: “Está trabalhando pro Lula, sim, inventando pesquisa…” Vendo que contra ignorância não há argumentos, a colega seguiu fazendo o trabalho que lhe cabia.
Presídio
No treinamento explicamos aos candidatos que presídios, hospitais, orfanatos e outros estabelecimentos afins teriam um procedimento diferente de abordagem. Sabendo que os recenseadores vão receber pagamento por cada questionário aplicado, um dos treinandos se saiu com essa: “O recenseador que pegar um setor com um presídio vai lavar a ‘jega’!”
Precisa morrer antes
Ao fazer o reconhecimento do entorno no bairro Potecas, o colega deparou com uma rua, de curta extensão, e que não tinha placa com o nome do logradouro (agora comigo é assim). Perguntou a uma senhora idosa que o observava e ela respondeu que realmente a via pública não tinha nome e que usavam a rua perpendicular como referência e completou: “Sou a moradora mais antiga daqui e querem colocar o meu nome na rua, mas eu não sei se pode, eu ainda estou viva…” Meu colega respondeu que realmente existe uma legislação que sugere que homenagens desse tipo devem ser feitas depois que o homenageado tenha morrido. “Faz mais sentido”, completou. Dona Menina pensou um pouco e disse: “Querem que eu morra!”
Com Z ou com S?
Após assinar o contrato uma nova recenseadora reteve o tablet na mão (assinatura com o dedo na tela do aparelho) e ficou pensando. “Dá para fazer de novo? Meu nome é com ‘S’ e eu escrevi ele com ‘Z'”…