13 de agosto de 2021

Folclore e religiosidade em cerâmica

Por José Carlos Sá

Dentre os traços culturais herdados dos imigrantes do arquipélago de Açores vindos para a região de Santa Catarina – especialmente Florianópolis, São José, Biguaçu, Palhoça e outras cidades – que recebeu os açorianos a partir do distante ano de 1748, estão a habilidade de trabalhar com cerâmica e a religiosidade, especialmente ligada à Igreja Católica. Na parte religiosa, o destaque é a Procissão do Senhor dos Passos, realizada desde 1766, que é a maior  representação de devoção do Sul do Brasil.

Em São José, a tradição de trabalhar o bairro é ensinado para as novas gerações. A Escola de Oleiros Joaquim Antônio de Medeiros recebe cerca de 190 alunos todos os anos e o resultado disso é levado à população em várias ocasiões e lugares. Este ano, nas comemorações do Divino Espírito Santo em junho/julho, artesãos da  Escola de Oleiros da avenida Beira Mar expuseram algumas peças no hall da Prefeitura.

Altar dos Oleiros 1 – Imagem de São José e figuras da Festa do Divino; 2 – Cartaz da mostra; 3 – Peças utilitárias e tainhas (Fotos JCarlos)

Atualmente está à mostra no Museu Histórico a exposição “Folclore Brasileiro Expressado na Cerâmica”. As peças, modeladas por artistas da Escola Joaquim Antônio de Medeiros, representam figuras que fazem parte do folclore brasileiro e da cultura popular. Alguns exemplos:

Da esquerda para direita de cima para baixo: Lenda do Boitatá, Lenda da Gralha Azul; Lenda da Furá-Pupú*; Lenda da Mula-Sem-Cabeça; Lenda do Lobisomem; Lenda do Pequi; Saci Pererê; Lenda da Vitória Régia e Lenda da Mandioca (Fotos JCarlos)

Da esquerda para a direita de cima para baixo: Lenda do Guaraná; Lenda do Curupira; Lenda do Boto (vejam os filhos do Boto embaixo); Lenda da Erva Mate (Foto Secom/PMSJ); Lenda da Cuca; Lenda do Bradador**; e Lenda das Bruxas de Itaguaçu*** (Fotos JCarlos e Secom/PMSJ)

O Bicho-Papão/Não tem educação/Almoça e janta/Sem lavar a mão (Verso de uma canção de ninar da minha infância)

Faço um destaque: achei estranha a presença da escultura da Lenda do Bicho-Papão, que eu não considerava como tal, mas a Marcela me lembrou que lenda é “uma narrativa fantasiosa transmitida pela tradição oral através dos tempos”. Então o “Bicho-Papão” é lenda.

* Furá-Purú – Diz a lenda que aconteceu a grande enchente e as pessoas, bichos e pássaros subiram para o alto de uma determinada árvore e somente essas pessoas e animais sobreviveram ao dilúvio por se salvarem em uma árvore brotada acima do casco de uma enorme tartaruga mítica dos índios Guarani. Lenda tradicional na região do Estado de Santa Catarina.

** Bradador – Conta a lenda que o Bradador é uma alma penada que vive nos campos das regiões centro-sul do país. Ele teria sido enterrado, mas como não havia pagado todos os seus pecados na terra, a terra o devolveu. Assim, a múmia, ou este espírito que habita um corpo seco, vai vagando pelas matas todas as sextas-feiras, após a meia-noite. Testemunhas dizem que os berros parecem de uma pessoa agonizando, outras, o descrevem como um lamento, seguido de fortes brados, daí o nome.

*** Lenda das Bruxas de Itaguaçu – A outra distinção que faço é com relação esta lenda. Acontece que a história foi criada pelo professor Gelci José Coelho (Peninha). Segundo ele, um grupo de bruxas resolveu fazer uma festa, mas não chamaram o diabo, por que o tinhoso não tinha procedimento. Mas ele soube do festim, foi até o local e transformou as mulheres em pedras, que hoje podem ser vistas na praia de Itaguaçu, na parte continental de Florianópolis. Em tupi-guarani, itaguaçu significa “pedra grande”.

Na exposição no Museu, acompanhando a modelagem, uma plaquinha de barro com o seguinte pedido: “Alecrim da terra/Que guarda as memórias/Alecrim da terra que desperta a alegria/desperta a vida, desfaz o julgamento/Desfaz as injustiças,/liberta as mulheres que foram pedras um dia,/Que sejam livres!/Que sejam livres!”