21 de abril de 2021

O palhaço e o discurso

Por José Carlos Sá

No curso de Jornalismo, na faculdade em que estudei, tinha um disciplina chamada “Técnicas Auxiliares de Jornalismo – Crítica de Teatro” (também tinha Crítica de Cinema e de Artes Plásticas). Por minha conta – além da bibliografia indicada pelo professor João Etiene Filho – eu lia o textos de peças de teatro que achava. Li Chico Buarque (Calabar, Ópera do Malandro, Gota D’água), do Dias Gomes (O berço do herói, O pagador de promessas, O Santo Inquérito), entre outros, além de obras Shakespeare e Tennessee Williams. Também li as peças teatrais de Plínio Marcos (1935-1999), que quase sempre eram censuradas pelo excesso de palavrões que ele inseria nos textos. Mas de uma peça que é ambientada na cadeia ou na zona, espera-se o quê?

Na década de 1980, Plínio Marcos passou a proferir palestras (Foto sítio oficial)

Eu era produtor de um programa que teve vida curta na TV Alterosa, o Jornalismo 5, que entrava de hora em hora nos intervalos de um programa de auditório. Era o anticlímax. As entrevistas era de assuntos que não interessavam ao público presente, que invariavelmente vaiava os entrevistados, apresentadores e, também nós da produção. Uma tarde, recebi o aviso de preparar as perguntas para o autor/ator Plínio Marcos, que faria o lançamento do show-palestra “O palhaço repete seu discurso”. Por sorte eu tinha lido uma matéria na Folha, poucos dias antes, sobre o assunto.

Redigi a pauta, começando sobre a opinião dele sobre os conchavos do Aureliano Chaves (então vice-presidente da República) e o senador Tancredo Neves, virtual candidato da oposição na sucessão do presidente João Figueiredo. Os apresentadores receberam a pauta e nem leram, reclamando que eu preparara perguntas políticas, quando entrevistado era ator e autor de teatro. Tentei argumentar, mas nem fui ouvido. Sentei e fiz outro roteiro.

Começo a entrevista e a apresentadora só conseguiu fazer a primeira pergunta, mais ou menos assim: Fale desse show que você trouxe para Belo Horizonte. Plínio Marcos respondeu a pergunta, já falando de política, da pouca vergonha, do desmando de Brasília e foi assim até o final do tempo do nosso quadro. Eu estava com tanta raiva, que nem fui assistir a entrevista dos bastidores, como era meu hábito. Assisti pela TV. Quando os apresentadores voltaram me pediram desculpas. Dei as costas e fui ao banheiro sorrir para o espelho.