A ideia do livro foi boa: contar os 170 anos da história da cidade de Teófilo Otoni (MG) sob o ponto de vista dos vereadores que vêm se revezando desde a instalação da primeira Câmara em março de 1881, quando o presidente da Casa exercia as funções de executivo e ficava responsável pela administração da cidade. A narrativa chega até os dias atuais se encerrando com a atual composição do Legislativo Municipal eleito em 2022. É interessante acompanhar a linha do tempo e como os fatos nacionais interferem lá na ponta, nas cidades mais distantes do centro do poder.
Em 1889, por exemplo, houve a mudança de regime de governo do país, com a República substituindo a Monarquia e as câmaras de vereadores foram extintas, sendo substituídas por um Conselho de Intendência. A administração das cidades passa para um intendente. A situação perdurou até a revolução de 1930, quando se criou o cargo de prefeito e as câmaras municipais passaram a ter o caráter legislativo. O atual modelo foi adotado em 1945 com a restauração da democracia.
Adesão ao Regime
A Câmara Municipal de Teófilo Otoni passou por estas mudanças com poucos traumas, considerando que é uma cidade no interior – no nordeste do Estado de Minas Gerais. Mas todas as mudanças tiveram reações entre os vereadores teófilo-otonenses, como foi na Proclamação da República, em novembro de 1889. Quando a notícia chegou à cidade, o acontecimento foi tratado como uma revolução passageira. “(…) Os membros da Câmara, além de monarquistas convictos, não estavam dispostos a comprometer os cargos políticos que ora ocupavam, além de não acreditarem na força política dos chefes que assumiam a presidência do Brasil (..)”. Apenas dois vereadores se revelaram republicanos e aprovaram telegrama cumprimentando o novo governo mineiro. Já na Revolução de 1964 a reação foi diferente. Praticamente todos aderiram ao golpe militar e fizeram discursos apoiando a derrubada do Governo de João Goulart.
As mudanças que ocorreram ao longo de 170 anos na economia e na sociedade de Teófilo Otoni foram resgatados em atas das Câmaras Municipais, em jornais da época e em livros de história e os fatos foram compilados e interligados resultando no livro “Os rumos de uma Filadélfia mineira pelas lentes da Câmara Municipal teófilo-otonense”, de autoria dos professores e pesquisadores Márcio Achtschin Santos, Rivani Lopes Negreiros e Valmer Batista Barroso (Edição Independente, Câmara Municipal de Teófilo Otoni, 2023).
Para constar, Filadélfia foi o primeiro nome de Teófilo Otoni, inspirado na cidade norte-americana homônima, que na data da fundação da localidade mineira era uma das maiores cidades daquele país, sinônimo de avanço econômico e tecnológico, o que inspirou o investidor Teófilo Benedicto Ottoni a nomear o povoado criado por ele.
Padrinho
Li com muito interesse, já que estou (re)descobrindo minha terra natal, sobre a qual não sei praticamente nada. Encontrei, entre as centenas de personagens citadas, nomes que me são familiares, como o do meu padrinho de batismo, o jornalista e escritor Humberto Luiz Salustiano Costa, que foi vereador (legislatura 1963-1966) e em 24 de abril de 1963 “cobrou do ministro do Trabalho uma maior fiscalização em Teófilo Otoni para que fosse cumprida no município a “[…] lei do salário mínimo””. Abre parênteses Tive pouco contato com ele, que foi amigo de infância de meu pai. Ao pesquisar para esta resenha, soube que o padrinho morreu ano passado. Ele morava em Caratinga desde a década de 1960. Fecham-se os parênteses.
Um outro fato que chamou minha atenção – e que foi ressaltado pelos autores – é que a extinção da Estrada de Ferro Bahia-Minas, em 1966, teve pouqissima repercussão no parlamento municipal. Talvez devido ao meu envolvimento pessoal e emotivo com a ferrovia que conheci mais por literatura do que pessoalmente, a não ser os laços familiares, eu esperava que os vereadores tivessem feitos discursos inflamados, agitado o povo, convocado quebra-quebra… Mas, não. Houve um clamoroso silêncio, quase de alívio. Interessante.
Desmilingüindo*
Gostei do livro, que foi presenteado pela vereadora Vânia Resende, uma amiga virtual que consegui antes de ir a Teófilo Otoni, com uma ressalva. Antes de terminar o primeiro capítulo, o exemplar começou a se desintegrar, com as folhas – mal coladas – se soltando facilmente. O restante da leitura foi feita com cuidado redobrado, para que as folhas soltas não caissem ou se perdessem. É uma falta de cuidado básico da editora, que deve ter usado grude de Maizena ou cuspe para juntar o encadernamento.
[* Usei a trema como saudosismo e porque não consigo ver essa palavra sem trema]